Parece que vinte por cento dos licenciados que o país recentemente produziu, resolveram emigrar e, a julgar pelo passado, nunca mais cá voltam. Mas ficaram ainda mais de 40.000 no desemprego, incluindo muita gente com o mestrado e o doutoramento. Pior do que nós... só o Haiti e a Jamaica. E depois perguntam como Portugal chegou ao que chegou. Chegou assim: com políticas de uma inimaginável estupidez, conduzidas por meia dúzia de indivíduos que ignoravam militantemente a história e a realidade do país e se aplicavam a imitar o que se fazia lá fora e, em particular, o que se fazia na "Europa". Os responsáveis são conhecidos. Pela parte "técnica", Veiga Simão, Fraústo da Silva, Roberto Carneiro e Marçal Grilo e, agora, Mariano Gago. Pela parte do governo, Cavaco e António Guterres, que envenenou tudo em que tocou. Infelizmente nem perante o desastre se aprendeu a lição. De Cavaco a Sócrates, com uma persistência que roça o patológico, o regime continua a repetir que Portugal precisa antes de mais nada de "qualificação" e "formação".
Já se percebeu há quase meio século que não vale a pena "sobreeducar" sociedades com um mercado de emprego semi-arcaico, porque as "competências", sejam elas quais forem, de facto desnecessárias, desandam para onde as podem usar e, naturalmente, lhes pagam bem. Na prática, o contribuinte português paga hoje a "qualificação" e a "formação" de uma pequena parte dos "recursos" , que por aí se chamam "humanos", da América e do Canadá, da Inglaterra e da França, da Espanha e do Brasil. E paga também a "qualificação" e a "formação" de 5.000 pessoas por ano, que o Estado enganou e condenou a uma vida para sempre frustrada.
E a história não acaba aqui. O Estado criou ou permitiu que se criasse uma enorme e abstrusa máquina, que vai do pré-escolar ao ensino superior oficial (hoje irremediavelmente degradado) e do "colégio" católico com subsídio por cabeça ao comércio vil de "universidades" privadas que são uma vergonha nacional. E, como o produto dessa máquina é largamente inútil, o Estado, para disfarçar a calamidade que ele próprio promoveu, mete inúteis num funcionalismo público igualmente inútil, que nos levou à calamidade maior da crise orçamental e da estagnação económica. A moral a tirar desta comédia sem desculpa é a de que o dr. Cavaco tem razão: nós gostamos mesmo da moeda má.
Vasco Pulido Valente hoje no Público
Adenda: Para quem não quiser pagar ao Belmiro de Azevedo a leitura do
Público, em breve disponibilizarei aqui o meu NIB.