Sobre a Vírgula
Muito bonita a campanha dos 100 anos da ABI (Associação Brasileira de Imprensa). Vírgula pode ser uma pausa... ou não. Não, espere. Não espere.. Ela pode sumir com seu dinheiro. 23,4. 2,34. Pode criar heróis.. Isso só, ele resolve. Isso só ele resolve. Ela pode ser a solução. Vamos perder, nada foi resolvido. Vamos perder nada, foi resolvido. A vírgula muda uma opinião. Não queremos saber. Não, queremos saber. A vírgula pode condenar ou salvar. Não tenha clemência! Não, tenha clemência! Uma vírgula muda tudo. ABI: 100 anos lutando para que ninguém mude uma vírgula da sua informação. Detalhes Adicionais: COLOQUE UMA VÍRGULA NA SEGUINTE FRASE: SE O HOMEM SOUBESSE O VALOR QUE TEM A MULHER ANDARIA DE QUATRO À SUA PROCURA. * Se você for mulher, certamente colocou a vírgula depois de MULHER... * Se você for homem, colocou a vírgula depois de TEM... |
sábado, dezembro 22, 2012
domingo, dezembro 09, 2012
CARTA AO PRIMEIRO-MINISTRO DE PORTUGAL
Exmo.
Senhor
Primeiro
Ministro
Hesitei
muito em
dirigir-lhe
estas
palavras, que
mais não dão
do que uma
pálida ideia
da onda de
indignação que
varre o país,
de norte a
sul, e de
leste a oeste.
Além do mais,
não é meu
costume nem
vocação
escrever
coisas de
cariz
político, mais
me inclinando
para o pelouro
cultural. Mas
há momentos em
que, mesmo que
não vamos nós
ao encontro da
política, vem
ela,
irresistivelmente,
ao nosso
encontro. E,
então, não há
que fugir-lhe.
Para
ser
inteiramente
franco,
escrevo-lhe,
não tanto por
acreditar que
vá ter em V.
Exa. qualquer
efeito – todo
o vosso
comportamento,
neste primeiro
ano de
governo,
traindo,
inescrupulosamente,
todas as
promessas
feitas em
campanha
eleitoral, não
convida à
esperança numa
reviravolta! –
mas, antes,
para ficar de
bem com a
minha
consciência.
Tenho 82 anos
e pouco me
restará de
vida, o que
significa que,
a mim, já
pouco mal
poderá
infligir V.
Exa. e o algum
que me inflija
será sempre de
curta duração.
É aquilo a que
costumo chamar
“as vantagens
do túmulo” ou,
se preferir, a
coragem que dá
a proximidade
do túmulo.
Tanto o que me
dê como o que
me tire será
sempre de
curta duração.
Não será,
pois, de mim
que falo,
mesmo quando
use, na frase,
o “odioso eu”,
a que aludia
Pascal.
Mas
tenho, como
disse, 82
anos, e,
portanto, uma
alongada e bem
vivida
experiência da
velhice – da
minha e da dos
meus amigos e
familiares. A
velhice é um
pouco – ou é
muito – a
experiência de
uma contínua e
ininterrupta
perda de
poderes.
“Desistir é a
derradeira
tragédia”,
disse um
escritor pouco
conhecido.
Desistir é
aquilo que vão
fazendo, sem
cessar, os que
envelhecem.
Desistir,
palavra
horrível.
Estamos no
verão, no
momento em que
escrevo isto,
e acorrem-me
as palavras
tremendas de
um grande
poeta inglês
do século XX
(Eliot): “Um
velho, num mês
de secura”...
A velhice,
encarquilhando-se,
no meio da
desolação e da
secura. É para
isto que
servem os
poetas: para
encontrarem,
em poucas
palavras, a
medalha eficaz
e definitiva
para uma
situação, uma
visão, uma
emoção ou uma
ideia.
A
velhice,
Senhor
Primeiro
Ministro, é,
com as dores
que arrasta –
as físicas, as
emotivas e as
morais – um
período bem
difícil de
atravessar. Já
alguém a
definiu como o
departamento
dos doentes
externos do
Purgatório. E
uma grande
contista da
Nova Zelândia,
que dava pelo
nome de
Katherine
Mansfield, com
a afinada
sensibilidade
e sabedoria da
vida, de que
V. Exa. e o
seu governo
parecem ter
défice,
observou, num
dos contos
singulares do
seu belíssimo
livro
intitulado The
Garden Party:
“O velho Sr.
Neave
achava-se
demasiado
velho para a
primavera.”
Ser velho é
também isto:
acharmos que a
primavera já
não é para
nós, que não
temos direito
a ela, que
estamos a
mais, dentro
dela... Já foi
nossa, já, de
certo modo,
nos definiu.
Hoje, não.
Hoje, sentimos
que já não
interessamos,
que, até,
incomodamos.
Todo
o discurso
político de V.
Exas., os do
governo, todas
as vossas
decisões
apontam na
mesma
direcção:
mandar-nos
para o cimo da
montanha,
embrulhados em
metade de uma
velha manta, à
espera de que
o urso
lendário (ou o
frio) venha
tomar conta de
nós.
Cortam-nos
tudo, o
conforto, o
direito de nos
sentirmos, não
digo amados
(seria muito),
mas, de algum
modo,
utilizáveis:
sempre temos
umas pitadas
de sabedoria
caseira a
propiciar aos
mais
estouvados e
impulsivos da
nova casta que
nos assola.
Mas não.
Pessoas, como
eu, estiveram,
até depois dos
65 anos, sem
gastar um
tostão ao
Estado, com a
sua saúde ou
com a
faltadela.
Sempre, no
entanto,
descontando
uma fatia
pesada do seu
salário, para
uma ADSE, que
talvez nos
fosse útil,
num período de
necessidade,
que se foi
desejando
longínquo.
Chegado, já
sobre o tarde,
o momento de
alguma
necessidade,
tudo nos é
retirado, sem
uma atenção,
pequena que
fosse, ao
contrato
anteriormente
firmado. É
quando mais
necessitamos,
para lutar
contra a
doença, contra
a dor e contra
o isolamento
gradativamente
crescente, que
nos
constituímos
em alvo
favorito do
tiroteio
fiscal:
subsídios (que
não passavam
de uma forma
de disfarçar a
incompetência
salarial),
comparticipações
nos custos da
saúde,
actualizações
salariais –
tudo pela
borda fora.
Incluindo,
também, esse
papel
embaraçoso que
é a
Constituição,
particularmente
odiada por
estes novos
fundibulários.
O que é
preciso é
salvar os
ricos, os
bancos, que
andaram a
brincar à Dona
Branca com o
nosso dinheiro
e as empresas
de tubarões,
que enriquecem
sem arriscar
um cabelo, em
simbiose
sinistra com
um Estado que
dá o que não é
dele e paga o
que diz não
ter, para que
eles
enriqueçam
mais, passando
a fruir o que
também não é
deles, porque
até é nosso.
Já
alguém,
aludindo à
mesma falta de
sensibilidade
de que V. Exa.
dá provas, em
relação à
velhice e aos
seus poderes
decrescentes e
mal apoiados,
sugeriu, com
humor ferino,
que se
atirassem os
velhos e os
reformados
para asilos
desguarnecidos
, situados, de
preferência,
em andares
altos de
prédios muito
altos: de um
14º andar,
explicava, a
desolação que
se comtempla
até passa por
paisagem. V.
Exa. e os do
seu governo
exibem uma
sensibilidade
muito, mas
mesmo muito,
neste gosto.
V. Exas.
transformam a
velhice num
crime punível
pela medida
grande. As
políticas
radicais de V.
Exa, e do seu
robôtico
Ministro das
Finanças -
sim, porque a
Troika
informou que
as políticas
são vossas e
não deles... –
têm levado a
isto: a uma
total
anestesia das
antenas
sociais ou
simplesmente
humanas, que
caracterizam
aqueles
grandes
políticos e
estadistas que
a História não
confina a
míseras notas
de pé de
página.
Falei
da velhice
porque é o
pelouro que,
de momento,
tenho mais à
mão. Mas o
sofrimento
devastador,
que o
fundamentalismo
ideológico de
V. Exa. está
desencadear
pelo país
fora, afecta
muito mais do
que a fatia
dos velhos e
reformados.
Jovens sem
emprego e sem
futuro à
vista, homens
e mulheres de
todas as
idades e de
todos os
caminhos da
vida – tudo é
queimado no
altar
ideológico
onde arde a
chama de um
dogma cego à
fria realidade
dos factos e
dos
resultados.
Dizia Joan
Ruddock não
acreditar que
radicalismo e
bom senso
fossem
incompatíveis.
V. Exa. e o
seu governo
provam que o
são: não há
forma de
conviverem
pacificamente.
Nisto, estou
muito de
acordo com a
sensatez do
antigo
ministro
conservador
inglês,
Francis Pym,
que teve a
ousadia de
avisar a
Primeira
Ministra
Margaret
Thatcher (uma
expoente do
extremismo
neoliberal),
nestes termos:
“Extremismo e
conservantismo
são termos
contraditórios”.
Pym pagou, é
claro, a
factura: se a
memória me não
engana, foi o
primeiro
membro do
primeiro
governo de
Thatcher a ser
despedido, sem
apelo nem
agravo. A
“conservadora”
Margaret
Thatcher –
como o
“conservador”
Passos Coelho
– quis
misturar água
com azeite,
isto é,
conservantismo
e extremismo.
Claro que não
dá.
Alguém
observava que
os americanos
ficavam muito
admirados
quando se
sabiam
odiados. É
possível que,
no governo e
no partido a
que V. Exa.
preside, a
maior parte
dos seus
constituintes
não se
aperceba bem
(ou,
apercebendo-se,
não
compreenda),
de que lavra,
no país, um
grande
incêndio de
ressentimento
e ódio. Darei
a V. Exa. – e
com isto
termino – uma
pista para um
bom
entendimento
do que se está
a passar.
Atribuíram-se
ao Papa
Gregório VII
estas
palavras: ”Eu
amei a justiça
e odiei a
iniquidade:
por isso,
morro no
exílio.” Uma
grande parte
da população
portuguesa,
hoje, sente-se
exilada no seu
próprio país,
pelo delito de
pedir mais
justiça e mais
equidade.
Tanto uma como
outra se
fazem, cada
dia, mais
invisíveis. Há
nisto, é
claro, um
perigo.
De
V. Exa.,
atentamente,
Eugénio
Lisboa