A memória mais antiga
"A memória mais antiga que temos dele é do som da sua voz, quando ainda lhe cabíamos no colo e ele nos embalava com os mistérios do mato, dos animais, do mundo mágico do cinema, do teatro e da fotografia.
«Isso faz-me lembrar uma história...» Quantas vezes ao longo dos anos não ouvimos isto? Quantas vezes não bastava um pequeno pormenor, uma palavra, um vulto que passava, uma expressão escutada, uma música, uma fotografia, uma pintura, a referência a um livro ou autor, para que ele fosse por aí fora, desfiando memórias deliciosas de um tempo perdido.
A família, os amigos, todos sabem como qualquer detalhe serve para que mais um pedaço de uma vida cheia nos fosse desvendado.
«Isso faz-me lembrar uma história...» E lá ia ele, pelas ruas da Alfama dos anos 20 do século passado, pelos estúdios da Tobis da época áurea do cinema português, pela prisão dos Açores, por um recanto remoto da Angola dos anos 50.
Estivéssemos à mesa de jantar, numa tertúlia com amigos; estivesse ele no autocarro da Carris, apanhado anos a fio, manhãzinha cedo, a caminho da CGTP Tudo servia para nele despertar uma memória. E quem o ouvia sorria, na certeza de encontrar ali uma história política, um pormenor pitoresco, o descrever de um tipo humano, tantas vezes razões para se emocionar.
Vantagens dos cabelos brancos, dirão da facilidade com que desfiava memórias como quem respira. Vantagens de quem viveu uma vida cheia, dizemos nós. De quem lutou pela liberdade num tempo em que era palavra proibida, de quem privou com vultos maiores do cinema português, de quem palmilhou (a expressão é a correcta, foi mesmo palmo a palmo) aquele semi-continente selvagem e maravilhoso que é Angola.
Mas o João que nós conhecemos não é só o magnífico contador de estorias. É um pai atento e um avô dedicado. Firme na hora de nos fazer estudar e respeitar os compromissos. Pleno de energia quando nos levava a nadar, a jogar à bola ou a correr pela marginal. Cada um de nós tem as suas ideias e seguiu livremente o seu caminho. Mas todos, sem excepção, fomos beber ao que o João nos ensinou quando se tratava de respeitar o próximo, lutar por uma sociedade mais justa ou não perdermos nunca a capacidade de nos indignarmos perante uma injustiça.
Há uns poucos anos, quando as pernas deixaram de lhe responder com a rapidez que a cabeça pedia, decidiu-se. «Como é isso dos blogues?», perguntou, naquela curiosidade permanente de miúdo, com os olhinhos a brilhar. De então para cá, dezenas, centenas de histórias foram sendo postas a escrito. Sem outro critério que não fosse o ir pondo no papel (ou melhor, no ecrã) episódios que viveu. Ingénuos, uns, dolorosos outros, alegres, outros ainda. Mas episódios que dificilmente nos deixam indiferentes. Não é uma história do último século que aqui é posta a escrito. Longe disso. Mas são histórias, episódios, que ajudam a perceber aquilo que somos e de onde vimos.
«Isso faz-me lembrar uma história...»
«Isso faz-me lembrar uma história...» Quantas vezes ao longo dos anos não ouvimos isto? Quantas vezes não bastava um pequeno pormenor, uma palavra, um vulto que passava, uma expressão escutada, uma música, uma fotografia, uma pintura, a referência a um livro ou autor, para que ele fosse por aí fora, desfiando memórias deliciosas de um tempo perdido.
A família, os amigos, todos sabem como qualquer detalhe serve para que mais um pedaço de uma vida cheia nos fosse desvendado.
«Isso faz-me lembrar uma história...» E lá ia ele, pelas ruas da Alfama dos anos 20 do século passado, pelos estúdios da Tobis da época áurea do cinema português, pela prisão dos Açores, por um recanto remoto da Angola dos anos 50.
Estivéssemos à mesa de jantar, numa tertúlia com amigos; estivesse ele no autocarro da Carris, apanhado anos a fio, manhãzinha cedo, a caminho da CGTP Tudo servia para nele despertar uma memória. E quem o ouvia sorria, na certeza de encontrar ali uma história política, um pormenor pitoresco, o descrever de um tipo humano, tantas vezes razões para se emocionar.
Vantagens dos cabelos brancos, dirão da facilidade com que desfiava memórias como quem respira. Vantagens de quem viveu uma vida cheia, dizemos nós. De quem lutou pela liberdade num tempo em que era palavra proibida, de quem privou com vultos maiores do cinema português, de quem palmilhou (a expressão é a correcta, foi mesmo palmo a palmo) aquele semi-continente selvagem e maravilhoso que é Angola.
Mas o João que nós conhecemos não é só o magnífico contador de estorias. É um pai atento e um avô dedicado. Firme na hora de nos fazer estudar e respeitar os compromissos. Pleno de energia quando nos levava a nadar, a jogar à bola ou a correr pela marginal. Cada um de nós tem as suas ideias e seguiu livremente o seu caminho. Mas todos, sem excepção, fomos beber ao que o João nos ensinou quando se tratava de respeitar o próximo, lutar por uma sociedade mais justa ou não perdermos nunca a capacidade de nos indignarmos perante uma injustiça.
Há uns poucos anos, quando as pernas deixaram de lhe responder com a rapidez que a cabeça pedia, decidiu-se. «Como é isso dos blogues?», perguntou, naquela curiosidade permanente de miúdo, com os olhinhos a brilhar. De então para cá, dezenas, centenas de histórias foram sendo postas a escrito. Sem outro critério que não fosse o ir pondo no papel (ou melhor, no ecrã) episódios que viveu. Ingénuos, uns, dolorosos outros, alegres, outros ainda. Mas episódios que dificilmente nos deixam indiferentes. Não é uma história do último século que aqui é posta a escrito. Longe disso. Mas são histórias, episódios, que ajudam a perceber aquilo que somos e de onde vimos.
«Isso faz-me lembrar uma história...»
Quero agradecer à minha irmã Ofélia este belo texto do prefácio, e ao meu amigo Jorge, por ter lá estado, pela foto, e sobretudo por ser meu amigo. Um abração, marreco!
(a propósito, na foto está o meu Pai e o meu filho mais velho)
10 Comments:
Sais ao teu pai, da cintura pa cima claro.
Um abração
O João Silva...e o Martin a quem eu chamava "Martins & Henriques", que vendiam Peugeots em Benguela...
O texto é muito bonito e guardo algumas memórias dos tempos difíceis daqui, das pescarias de "kabuenhas" que eram fritas, verdadeiros pitéus que dividiamos com a cadela, dos livros, muitos, que havia nas estantes e do quartinho das fotografias, montões...
e sobretudo da sua coerência e integridade.
Para mim o João Silva significou sempre cinema e rolos de fotografias que tu aproveitavas, 400 asa, Bié e Girão e amizade.
Uma dessas tuas fotos está no meu site no post NGOLA|ALOGN mirrors...
Abraço
Fico contente com os vossos comentários. Aquele primeiro, enfim, tem desculpa...
O texto foi escrito por mim, pelo Martim e pelo Rodrigo
Ofélia
Também quero dar um abraço com muita amizade ao João Silva e cumprimentar toda a familia.
Virgílio
Virgílio Covadonda Hastings? És mesmo tu meu grande vadio?
Talvez , "Fustino" , talvez... Hastings de Faro .
Estou radiante por saber de ti e dos teus e esta epopeia do nosso querido João Silva - agora que me sinto velho e desmotivado- toca-
-me !Vou encarar a " coisa " de outra forma, com o exemplo dele (mais uma vez...)
Abraço
Virgílio
Para todos especialmente ao joão Silva
Grande Abraço
Zé António
Hoje andei por aqui e descobri esta boa notícia!!!!
Fiquei feliz!
Parabéns a todos!!!
Bjs
Cris. Garcia
12nov08
Aditamento:
Já fiz um post sobre o livro!
;)
CG
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