quarta-feira, janeiro 10, 2007

O personagem

A primeira vez que o vemos (e afinal a única) é logo após o genérico, logo na primeira cena, está ele em grande plano, de costas para a câmara, com um casaco grosso de gola levantada e o cabelo em desalinho. Passam-se uns largos segundos, talvez um minuto, talvez mais, sem que alguma coisa aconteça. Não há o mais pequeno movimento, nem um som sequer, e só quando se vêem umas pessoas a cruzarem a rua lá ao fundo, se ouve de repente um grito: Corta! que provoca um sobressalto na sala, e umas quantas gargalhadas. Mas o que é isto, foda-se? O que é que anda aquela gente ali a fazer? ...vamos ter que repetir tudo outra vez. Atenção, silêncio... claquette. E entra a correr um tipo pequenino que se põe à frente do actor, virado para a câmara, a gritar umas coisas para o ar, e depois bate com a claquette, sai a correr por onde veio e ouve-se de novo a voz, meio chateada. Acção! E o actor resolve, finalmente, mexer-se. Roda a cabeça e olha para um dos lados da rua, depois para o outro... mas não se decide a fazer mais nada, e acaba tudo como estava, na mesma. Ouve-se então, de novo, a voz de há pouco, mas agora mais irritada ainda: Corta, foda-se! Corta-me esta merda! E entrando em campo, aparece ao fundo da rua o dono daquela voz. De chapéu e charuto na mão, a esbracejar e a gritar daquela maneira, devia ser o realizador. Corta-me esta merda! E vem direito ao actor que continuava quieto e de costas no ecran, mas foi a última coisa que se viu, antes do ecran ficar completamente negro. Felizmente o técnico de som, ou porque era surdo, ou por outra razão qualquer, não desligou o gravador, porque se ouve perfeitamente o realizador, assim que chega à frente do actor...

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Aguardo desenvovimento...
Bjs O

7:58 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Profundo, muito profundo! A roçar o brilhante, talvez.

3:30 da tarde  

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